História da Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

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Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

A Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro foi fundado em 1677, quando quatro irmãs da Ordem das Clarissas, de Évora, Portugal, vieram para o Brasil, a fim de implantar o ensino religioso.

Junto ao dique Tororó, antes chamado dique do Desterro, havia uma ermida de taipa com a invocação de Nossa Senhora do Desterro.

Com esmolas do povo, a ermida foi melhorada e transformou-se em capela, recebendo azulejos na capela-mor e altares colaterais com retábulos dourados e ornamentos de prata.

Junto a essa pequena igreja, o mestre de campo João de Araújo edificara algumas casas com a intenção de fundar um recolhimento para mulheres de “boa vida”, mas não chegou a efetivar esse projeto.

Em 1644, com o objetivo de instalar o primeiro convento para mulheres do Brasil, organizou-se uma lista de contribuições, que incluía os homens mais prósperos da cidade, enquanto Sebastião de Brito e Castro procurava na Metrópole religiosas que quisessem vir para a Bahia.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro

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Por Provisão Régia de 7 de fevereiro de 1665, tendo como governador e capitão-general Dom Vasco de Mascarenhas, conde de Óbidos, foi concedida licença para a criação de um convento de religiosas de véu preto, até o número de 50, que fossem da observância de São Francisco.

Estariam sujeitas ao arcebispado da Bahia, podendo ter como dote oito mil cruzados de renda, provinda de foros de casas, fazendas e currais de gados.

Os peticionários, quando se dirigiram ao rei, Dom Afonso VI, argumentavam não haver convento feminino no Brasil para recolher suas filhas e faltar meios financeiros para mandar as moças professarem nos conventos de Portugal. Mencionavam ainda os perigos que a travessia do Atlântico oferecia.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

A bula de 13 de maio de 1669, do papa Clemente IX, que dava licença à instalação do convento feminino na Bahia, narrava a história de algumas moças do Brasil que terminaram cativas dos piratas infiéis ou que pereceram em naufrágios.

O Senado da Câmara, então formado pelos homens bons da sociedade baiense, responsabilizou-se pelas primeiras obras, executadas a partir de 1671.

As freiras fundadoras do convento do Desterro, oriundas do convento de Santa Clara de Évora, chegaram à Bahia em 29 de abril de 1677, seis anos depois do início da construção das acomodações para abrigá-las.

Foram, porém, obrigadas a permanecer na embarcação em que vieram pelo período de dez dias, enquanto se preparavam precariamente os seus aposentos.

As recém-chegadas eram as madres Margarida da Coluna, Jerônima do Presépio, Luísa de São José e Maria de São Raimundo.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Em referência à origem das fundadoras, o convento receberia o nome de Santa Clara do Desterro da Bahia.

Em 28 de janeiro de 1678, alguns meses após o desembarque das religiosas de Évora, ingressaram no convento as duas primeiras moças da Bahia, Marta Borges da França e sua irmã Leonor.

Na vida religiosa, receberam o nome de sóror Marta de Cristo e sóror Leonor de Jesus, respectivamente.

Em 1º de setembro de 1679, João de Couros Carneiro, escrivão vitalício da Câmara e administrador das obras das freiras, mandou reiniciar a construção do convento, que teria a capacidade de abrigar somente 15 religiosas, lançando-se a pedra fundamental no dia 22 de outubro de 1679.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Trabalharam nesse período os mestres pedreiros Francisco Pinheiro e João da Costa Guimarães, sob a administração do coronel Domingos Pires, que recolheu quatro filhas ao convento e era seu tesoureiro.

Dada a autorização para a construção, o Senado da Câmara, como se viu, se obrigara, através de escritura, a concorrer com verbas.

Entretanto, o convento foi erguido graças a doações de dote das religiosas, como declarou o arcebispo, frei Dom Manoel da Ressurreição, no Livro da Fundação, em 1º de agosto de 1689, esclarecendo que as freiras se sustentavam com a renda resultante dos juros dos dotes das religiosas, ficando livre do padroado real.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Não deve ter sido muito fácil a vida dessas primeiras religiosas no século XVII, na Bahia, no fim da linha que marcava a segunda cumeada, a cavaleiro dos atuais dique do Tororó e Baixa dos Sapateiros.

A cidade começava então a se povoar nessa direção, por causa da presença dos conventos e igrejas.

Seguindo o costume estabelecido pelo Concílio tridentino e pela instituição do padroado, os leigos fizeram doações que permitiram a construção e ornamentação do conjunto que chegou até o presente.

Com a separação entre Igreja e Estado, na República, e o enfraquecimento da Igreja Católica no oitocentos, por força do liberalismo e da mudança de mentalidade, as doações começaram a rarear.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Tempos antes, porém, os doadores começaram a usar subterfúgios para postergar as doações dos chamados bens de mão-morta.

Muitos deixavam cláusula testamentária guardando para si o usufruto do bem doado até sua morte.

Outros doavam bens, principalmente imóveis, a serem repassados às religiosas uma, duas e até três gerações depois. Por não terem estabelecido um
controle mais rígido de seus bens, as irmãs clarissas perderam muitas propriedades.

Doações das próprias religiosas eram frequentes.

Assim, em 1683, entrou para o convento Antônia de Góis, viúva de Manoel Pereira Pinto, que patrocinou a construção do coro das religiosas. Para esse fim, doou dez mil cruzados.

As obras das celas dormitórios foram feitas à medida que mulheres, jovens ou mais idosas, recolhiam-se ao convento e faziam doações, como as filhas de Manoel de Oliveira Porto, que contribuiu com 20 mil cruzados.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Domingos Pires de Carvalho, que administrava a obra do convento, faleceu em 1708. Dedicou-se desde 1683 a construir o edifício de pedra e cal, acompanhado do mestre carpinteiro João Pereira de Souza, que fez os assoalhos dos dormitórios e torneou os corredores e as grades.

Francisco Pinheiro e João da Costa Guimarães foram os mestres pedreiros que, por volta de 1687, encarregaram-se de ampliar as celas do convento, aumentando o hospício que se improvisara para receber as primeiras freiras.

Vários acréscimos foram feitos posteriormente.

Em 1695, o mestre entalhador começou a cumprir o trabalho ajustado com a abadessa, sóror Catarina do Sacramento, executando o retábulo da capela-mor da igreja.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Previa-se a finalização da obra nas “endoenças” do ano de 1697. Era então procurador do convento o licenciado padre Inácio de Souza.

Em 1709 entrava na obra o pedreiro Manoel Quaresma, que efetuou vários trabalhos das janelas ao telhado e de cantaria.

Depois de um impulso inicial, a construção do convento, levantado em torno de dois claustros ou pátios, prosseguiu vagarosamente. Assim é que, em 1719 – 1721, trabalhava-se no mirante, construído pelo mestre pedreiro Manoel Antunes Lima, cabendo ao sargento-mor Inácio Teixeira Rangel medir e avaliar a obra.

Ficou pronta nessa época a casa do capelão.

O pedreiro Manuel Antunes Lima e o mestre carpinteiro Artur da Silva Reis continuavam os trabalhos em 1726.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Silva Reis dedicava-se especialmente aos assoalhos, janelas e portas, enfim, aos arremates finais, utilizando vários tipos de madeira.

No século XVIII, as janelas tinham balaústres torneados e a cela da madre abadessa dispunha de um balcão, sustentado por oito caibros.

Em documento do marquês de Angeja, Dom Pedro Antônio de Noronha (1714-1718), encontra-se a informação de que já viviam no convento 50 religiosas de
véu preto e 25 de véu branco, faltando ainda a quarta ala para fechar a clausura.

Em meados do século XVIII, o edifício da igreja já estava em boa parte concluído e decorado.

Em 1758, durante a gestão da abadessa sóror Damásia da Purificação, o entalhador André Ferreira de Andrade cuidou do guarnecimento de portas e arremates, além dos dois púlpitos.

No ano seguinte, Eusébio da Costa Dourado, também entalhador, fazia as guarnições das janelas da capela-mor e quatorze castiçais de madeira entalhada e pintada.

A torre do claustro só foi concluída em 1774, quando, além de se assentarem os azulejos, instalou-se um relógio vindo de Lisboa.

A peça, com mostradores de azulejos, chegara ao convento com problemas: as rodas do maquinismo tinham dentes a menos e faltavam os ferros do mostrador.

Nesse mesmo ano foram colocados os três sinos da torre nova, feitos pelo ferreiro Aurélio Soares de Araújo.

A torre divide uma das alas do claustro ao meio, formando uma composição pouco comum. Tem estrutura quadrada e dois andares divididos por cornijas salientes.

É coroada por cobertura em forma de bulbo. Verticalmente apresenta uma porta de entrada e uma porta superior para um pequeno balcão com frontão simples, mas que revela influência rococó.

Na primeira parte do andar da torre há um óculo cercado por moldura saliente e o relógio. Na parte superior estão as aberturas para os sinos.

Chama a atenção o mirante, de dois pisos, localizado em um dos ângulos do convento.

No século XIX, a fisionomia interna da igreja foi bastante alterada, com a substituição das talhas barrocas dos altares. Os trabalhos iniciaram-se pelo zimbório e o forro da capela-mor, entre 1844 e 1847.

As obras de pedreiro foram feitas pelo mestre Felipe Constanço e as de carpinteiro, pelo mestre José Custódio da Purificação.

Luís Francisco da Silva começou o retábulo, tribunas e talha do forro da capela-mor. Tinha mais de 80 anos e faleceu em 1850.

Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador
Igreja e Convento de Santa Clara do Desterro em Salvador

Foi substituído pelo mestre entalhador Cipriano Francisco de Souza, que, entre 1851 e 1852, completou as obras do novo retábulo da capela-mor, das quatro tribunas com suas bacias e executou dois altares colaterais, o arco cruzeiro, dois púlpitos e quatro arremates para as portas.

Somam-se a esses trabalhos quatro jarras para a capela-mor, 264 estrelas para o zimbório e obras na sacristia.

A obra de talha feita por Cipriano Francisco da Silva foi complementada pelo pintor e dourador Manoel Joaquim Lino, a partir de 1854. Lino pintou e dourou toda a obra de talha nova do interior da igreja, ou seja, três altares, púlpitos, grades do coro, tribunas, arremates das portas e, também, a sacristia.

Com essas obras desaparecia a aparência barroca, especialmente da igreja, e o conjunto adquiria feição neoclássica.

O piso atual da igreja e do presbitério foi assentado durante essa reforma.

Para esse fim, recebeu-se grande quantidade de pedras, sobretudo lioz, procedente de Lisboa, e mármore de Gênova.

A imagem de Nossa Senhora do Desterro foi executada pelo escultor Domingos Pereira Baião, entre 1850 e 1854, e substituiu a original. Esse mesmo escultor cuidou de restaurar as imagens de São José e São Francisco.

Nenhuma parte da igreja ficou sem ser retocada ou ter suas peças substituídas.

Em 1862-1863, consertava-se o coro de cima.

O forro do coro, dividido em quadros, apresenta pintura de autor desconhecido.

No século XX, transferiram-se dois painéis de azulejos, de cerca de 1750, do coro barroco do pavimento superior para o coro de baixo, onde foram assentados por volta de 1950.

O coro perdeu também, no início do século XX, as estalas ou cadeiras, feitas no período em que se encontrava no convento sóror Catarina do Monte Sinai, uma das filhas de João de Couros Carneiro.

Transferiram-se essas estalas para a capela-mor da catedral basílica, onde ocuparam as primeiras filas, mas de lá já foram retiradas.

A ordem das clarissas foi extinta no início do século XX com a morte das três últimas freiras que a compunham.

O convento e o restante de seus bens de raiz foram passados à congregação franciscana da Pequena Família do Sagrado Coração de Jesus, e atualmente são as religiosas franciscanas que administram o conjunto.

Localização: R. Santa Clara, S/N – Nazaré, Salvador

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