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Ao longo de mais de trezentos anos, Minas Gerais sustentou a Coroa portuguesa, ajudou a construir a ideia de uma nação brasileira independente e soube manter-se sempre influente nas decisões políticas brasileiras.
No início foi o sertão.
Nos primeiros séculos da colonização, o território que hoje chamamos Minas Gerais era, aos olhos dos colonizadores, uma vastidão de escarpas e florestas impenetráveis, habitada por criaturas desconhecidas – calcula-se que à época da chegada dos europeus (1500), uma centena de grupos indígenas vivesse na região.
Um território ameaçador, mas também cheio de promessas: esperava-se que no continente houvesse os metais e pedras preciosas que moviam os conquistadores; certamente havia braços escravos para o trabalho nas plantações de cana-de-açúcar que no primeiro século de colonização vinham se expandindo nas áreas litorâneas.
Assim, para apresar indígenas e descobrir riquezas minerais, iniciou- se a epopeia do desbravamento da América portuguesa.
Expedições organizadas pelo governo e por particulares percorriam o Brasil e alargavam suas fronteiras.
Partindo de São Paulo, exploradores venciam a serra da Mantiqueira, alcançando as terras então conhecidas como sertão dos Cataguás (nome dos índios da região); vindos da Bahia, percorriam a região do rio Jequitinhonha e as margens do rio São Francisco.
Foi só no fim do século XVII, porém, que se encontrou a primeira amostra significativa de ouro, nas proximidades do rio das Velhas, perto da atual Sabará.
A notícia correu a colônia. Minas Gerais nascia.
HISTÓRIA DE MINAS GERAIS
1. EXPLORAÇÃO DO OURO
O anúncio dos primeiros achados provocou uma desesperada corrida em direção à região das minas.
Aventureiros vinham de todos os pontos da colônia, estimulados pelo sonho da riqueza fácil: a exploração do ouro de Minas, encontrado no leito dos rios e córregos, dispensava grandes investimentos de capital.
A região também recebeu milhares de europeus; cerca de 600 mil portugueses desembarcaram na América portuguesa nos primeiros sessenta anos do século XVIII.
A explosão demográfica, somada à precariedade das rotas de abastecimento, levou a terra do ouro ao caos. Surtos de fome assolaram a região, e senhores e escravos chegaram a comer animais de carga e insetos.
Em 1707, os paulistas, descobridores das minas, exigindo o controle da área de exploração do ouro, entraram em conflito com portugueses e colonos vindos de outras capitanias — a quem chamavam, pejorativamente, de emboabas, ou seja, “estrangeiros”.
A Guerra dos Emboabas estendeu-se por dois anos e culminou com o massacre dos paulistas.
Após o confronto, o governo português criou a capitania de São Paulo e Minas do Ouro, para garantir a exploração de uma zona que estava se revelando incontrolável; muitos paulistas, por sua vez, rumaram para o oeste, em direção a Goiás, em busca de novas jazidas.
Entre conflitos e tensões consolidava-se uma nova sociedade na região das lavras.
Ao longo da primeira metade do século XVIII surgiram roças de subsistência e abriram-se os caminhos que uniam o território das minas ao litoral da colônia. Quem não possuía fontes próprias de abastecimento submetia-se aos preços altíssimos cobra dos pelos mercadores – tropeiros — que traziam víveres do Sul e da Bahia.
Esboçava-se, pela primeira vez, a integração da colônia.
2. UMA NOVA ORDEM SOCIAL
À medida que encontravam novos veios de ouro, os mineradores fundavam arraiais, logo transformados em vilas populosas: Caeté (1701), Conceição do Mato Dentro (1702), São José del-Rei, atualmente Tiradentes (1702), São João del-Rei (1704), Vila Rica, hoje Ouro Preto (1711), Mariana (1711), Sabará (1711), Congonhas do Campo (1734), Paracatu (1798).
Nelas circulavam comerciantes, artesãos, médicos, advogados e funcionários ligados à administração e ao controle das minas.
E cativos: em meados do século XVIII havia em Minas cerca de 100 mil escravos de origem africana.
As condições de vida desses trabalhadores eram precárias, mas eles tinham alguma possibilidade de conseguir a liberdade: não era incomum que os senhores oferecessem pequenos prêmios em ouro para estimular a lida nas minas; além disso, os escravos podiam obter o metal escondendo-o nos ca¬ belos ou sob as unhas até juntarem o suficiente para comprar sua alforria.
Assim, negros forros passaram também a compor o cenário das cidades, muitas vezes transformados em pequenos comerciantes.
O afluxo de europeus, colonos de várias regiões, negros e índios resultou num processo de mestiçagem até então inédito na colônia.
3. SOB O CONTROLE DA COROA PORTUGUESA
Durante quase um século a colônia portuguesa viveu em torno da economia do ouro.
A Coroa portuguesa, imersa em dívidas, montou um gigantesco aparato de fiscalização e cobrança de tributos.
A princípio, os mineradores deviam a Portugal a quinta parte de todo o ouro encontrado.
Depois, o governo fixou um montante mínimo a ser arrecadado.
Se não se atingisse a cota pretendida, ocorria a derrama – um regime de exceção no qual cobradores invadiam residências e confiscavam bens.
Em 1720, a cobiça da coroa portuguesa resultou na primeira rebelião dos colonos de Minas.
A revolta, ocorrida em Vila Rica, foi rapidamente esmagada, e um de seus líderes, o tropeiro Filipe dos Santos, executado.
Em nova tentativa de controle, o governo separou Minas e São Paulo, criando a capitania de Minas Gerais, com capital em Vila Rica, hoje Ouro Preto.
Em 1727 anunciou-se que diamantes haviam sido encontrados no arraial do Tijuco, hoje Diamantina, nas montanhas conhecidas como Serro Frio.
Provavelmente uma década antes os mineradores já haviam descoberto as pedras, mas não divulgaram a notícia para despistar o fisco.
Com razão: as regras na área, transformada no Distrito Diamantino, eram ainda mais rígidas do que nas zonas produtoras de ouro.
Durante cem anos, ninguém podia circular pelo distrito sem autorização oficial.
Veja também Cidades Históricas de Minas Gerais
4. INCONFIDÊNCIA MINEIRA
Com o passar do tempo, a sociedade urbanizada das Minas tornava- se também culturalmente mais rica.
Vindo da Europa, o barroco assumia feições próprias na colônia, firmando-se como primeira forma de arte nativa. Filhos de famílias endinheiradas partiam para universidades europeias e ao voltar traziam novas ideias – entre elas, a da república.
Em 1789, na mesma Vila Rica que assistira à morte de Filipe dos Santos, um grupo de intelectuais, comerciantes, mineradores e proprietários rurais, endividados e exasperados pela ameaça de derrama, concebeu uma revolta que instituísse a república independente das Minas. Delatados, os inconfidentes foram presos; alguns, deportados; outros tiveram os bens confiscados.
Apenas o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, foi enforcado e esquartejado, em abril de 1792.
Muitos anos depois, a República brasileira elevou-o ao patamar de mártir, incluindo-o na galeria dos heróis da pátria.
5. UM ESTADO AGRÁRIO
No fim do século XVIII, o ouro começou a rarear. A exploração das jazidas minerais profundas exigia capital e conhecimento técnico inexistentes no Brasil.
A procura de novas reservas de ouro e gemas ou de espaço para a criação de gado, exploradores adentravam os sertões, fundavam vilas e delimitavam as fronteiras da capitania: as regiões Norte e Nordeste, próximas do vale do Jequitinhonha, que pertenciam à Bahia, foram anexadas a Minas na virada do século XIX; o Triângulo, disputado com Goiás, passou a ser mineiro em 1815.
Em pouco tempo, a capitania já não era a terra do ouro; as cidades esvaziavam-se.
A produção de gêneros para abastecer as ex-cidades mineradoras e o Rio de Janeiro, alçado à sede da Coroa portuguesa e, depois, do governo brasileiro, movimentava a economia local.
A pecuária espalhou-se pelo sul de Minas e a ela juntaram-se a indústria leiteira e a cafeicultura. No fim do século XIX, as minas falidas foram adquiridas por empresas inglesas, que as exploraram até a exaustão das lavras.
Sustentada pela elite rural, a província de Minas Gerais continuou exercendo sua influência ao longo do século XIX.
Em 1842, liberais mineiros e paulistas, desgostosos com a influência conservadora da elite rural sobre o governo central, deflagraram a Revolução Liberal.
Em São Paulo, o movimento foi reprimido em junho; Minas, sob o comando de Teófilo Otoni, resistiu até agosto, quando capitulou às tropas do duque de Caxias na cidade de Santa Luzia.
A força das oligarquias mineiras estendeu-se após a República.
A partir de 1894, políticos de Minas e de São Paulo se revezariam no poder, no pacto conhecido como política do café com leite.
Nessa mesma década, a capital do estado foi transferida de Vila Rica para a recém-construída Cidade de Minas, depois Belo Horizonte. Entre 1898 e 1930, três dos onze presidentes eleitos eram mineiros.
Quando a aliança entre as oligarquias rurais se rompeu, os mineiros aliaram-se aos gaúchos na Revolução de 30, que levaria Getúlio Vargas à presidência e poria fim à Primeira República.
Em 1937, por meio de um golpe de Estado, Getúlio Vargas implantaria sua ditadura, o Estado Novo.
Minas Gerais, que apoiou a ascensão de Getúlio Vargas, trabalhou também por sua queda, publicando em 1943 o Manifesto dos Mineiros, documento que conclamava o país à volta à democracia, o que ocorreria em 1945.
Ainda na década de 1940 ocorreria uma mudança no cenário econômico, com a fundação da Companhia Vale do Rio Doce, para explorar minério de ferro — o estado voltava, por novos caminhos, à mineração.
6. JUSCELINO KUBITSCHEK
Entre 1934 e 1954, Juscelino Kubitschek de Oliveira, nascido em Diamantina, foi deputado federal, prefeito de Belo Horizonte e governador do estado.
Na capital, deixou sua marca com a construção do complexo da Pampulha, projeto de Oscar Niemeyer.
Em 1955, foi eleito presidente; no ano seguinte, pôs em prática um ambicioso plano de metas que visava à industrialização do país e ao desenvolvimento de seu parque automobilístico.
Também naquele ano Juscelino iniciou a construção da nova capital do país, Brasília, projetada por Lúcio Costa e, novamente, Niemeyer, e inaugurada em 1960.
O preço da euforia modernizadora foi o endividamento do Brasil e o aumento da inflação.
Ainda assim, os anos de Juscelino Kubitschek no governo (entre meados da década de 1950 e o início da de 1960) marcaram a história brasileira como um de seus períodos mais otimistas, em que se acreditou na formação de um país moderno e democrático – um sonho que ruiria poucos anos depois, em 1964, quando um golpe de Estado instaurou a ditadura militar no Brasil.
Os tanques de guerra que encerrariam o período democrático saíram da guarnição de Juiz de Fora.
Entre os principais articuladores do golpe estava o governador mineiro, Magalhães Pinto. Durante a ditadura, Minas viveu um surto de desenvolvimento, com a expansão dos complexos de mineração e siderurgia e a instalação, em Betim, de um polo automobilístico.
7. REDEMOCRATIZAÇÃO
Quando, vinte anos depois, a ditadura militar começou a ceder às pressões da sociedade brasileira, outro político mineiro figurou entre os líderes da articulação do retorno dos civis ao poder: em janeiro de 1985, Tancredo de Almeida Neves, homem de confiança de Juscelino, foi eleito presidente pelo Congresso Nacional.
Pouco antes de ser empossado, Tancredo adoeceu gravemente; o vice, José Sarney, assumiu. Incrédulo, o país assistiu à sua morte em 21 de abril, dia da execução de Tiradentes.
Alguns anos depois, Minas faria mais um presidente: Itamar Franco, vice de Fernando Collor, assumiu o cargo em 1994, quando es¬ te, acusado de corrupção, perdeu o mandato.
Sob o governo Itamar, o então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso lançou o Plano Real para conter a inflação. O sucesso do plano garantiu a Fernando Henrique a presidência, em 1996.
No século XXI, Minas Gerais é o segundo estado mais industrializado do Brasil; é o maior produtor de minério de ferro, nióbio, zinco e ouro do país; a agricultura e a pecuária prevalecem nas regiões Sul e Sudeste e no Triângulo Mineiro.