Fundação da cidade de São Paulo e os Bandeirantes

Este post também está disponível em: Português English

Fundação da cidade de São Paulo e os Bandeirantes

1. Introdução

Neste capítulo iremos estudar a fundação da cidade de São Paulo e a sua importância para o processo de colonização e povoamento do Brasil colonial.

Além disso, estudaremos a ação dos bandeirantes paulistas no processo de interiorização do território brasileiro e na consequente descoberta de metais preciosos.

A fundação de São Vicente e, mais tarde, de São Paulo foram marcos na história do Brasil, pois permitiram o surgimento de regiões habitadas por europeus fora do nordeste.

Além disso, a ação dos bandeirantes paulistas, neste processo, foi de suma importância, pois os mesmos passaram a desenvolver atividades econômicas relacionadas à caça ao índio, e mais tarde, seriam os responsáveis diretos pela ampliação do Tratado de Tordesilhas.

Esta pintura do século 15 ilustra como o Tratado de Tordesilhas foi assinado
Esta pintura do século 15 ilustra como o Tratado de Tordesilhas foi assinado
O Tratado de Tordesilhas, que dividiu o controle de territórios pelo mundo entre portugueses e espanhóis.O acordo foi uma tentativa de apaziguar disputas pela posse de terras entre as duas nações, então potências mundiais.

O descobrimento da América, em 1492, tornou ainda mais urgente a necessidade de um entendimento entre Portugal e Espanha sobre as terras além-mar, mesmo aquelas que ainda faltavam descobrir.

Com o passar dos séculos, os limites criados no papel foram desrespeitados e entraram no palco das disputas na América os canhões e as fortalezas.

O Tratado de Tordesilhas foi assinado entre Portugal e Espanha em 7 de junho de 1494. Recebeu este nome pois os diplomatas que discutiram os termos do documento se reuniram na cidade de Tordesilhas, na região de Castela e Leão.

As duas nações já tinham produzidos acordos outras vezes e, portanto, não chegava a ser uma grande novidade sentar e discutir.

Dessa vez, o tratado definiu uma linha imaginária que ficava a cerca de 1.780 quilômetros (ou 370 léguas) a oeste das ilhas de Cabo Verde.

Esse limite, chamado de Meridiano de Tordesilhas, era uma referência: a oeste dele, as terras pertenceriam a Espanha; a leste, seriam de Portugal.

Nenhuma das duas nações sabia ao certo, naquele momento, quanto de “terra” isso envolvia. Hoje existe até um marco em Laguna, cidade da região sul de Santa Catarina, por onde passava o meridiano.

Mapa do Brasil de 1730 "Nova et Accurata Brasiliae Totius Tabula, Auctore Ioanne Blaeu I.F.", Blaeu/Schenk Este mapa escasso é o terceiro mapa do Brasil de Johannes Blaeu. Ele inclui as capitanias ao longo da costa e é uma melhoria significativa em relação aos mapas anteriores de Blaeu do Brasil. A bela cartela é cercada por querubins e um deus do rio. Esse mapa, desenhado por Joannes de Broen e gravado por Abraham Wolfgang, foi concluído pouco antes do grande incêndio que destruiu a gráfica e, portanto, foi incluído em apenas uma edição dos atlas de Blaeu. Em 1694, Pieter Schenk adquiriu várias placas de cobre de Blaeu, incluindo esta.
Mapa do Brasil de 1730 “Nova et Accurata Brasiliae Totius Tabula, Auctore Ioanne Blaeu I.F.”, Blaeu/Schenk Este mapa escasso é o terceiro mapa do Brasil de Johannes Blaeu. Ele inclui as capitanias ao longo da costa e é uma melhoria significativa em relação aos mapas anteriores de Blaeu do Brasil. A bela cartela é cercada por querubins e um deus do rio. Esse mapa, desenhado por Joannes de Broen e gravado por Abraham Wolfgang, foi concluído pouco antes do grande incêndio que destruiu a gráfica e, portanto, foi incluído em apenas uma edição dos atlas de Blaeu. Em 1694, Pieter Schenk adquiriu várias placas de cobre de Blaeu, incluindo esta.

2. Fundação de São Paulo

Foi a 25 de janeiro de 1554 que um grupo de missionários jesuítas, chefiado pelo padre Manuel da Nóbrega, se fixou num planalto chamado então de Piratininga, onde fundou um colégio destinado à evangelização das populações ameríndias.

Após a consagração do local, foi-lhe dado o nome de São Paulo, por ser o dia dedicado ao apóstolo com esse nome.

A escolha do local, que fica a uns 50 km da costa, prendeu-se com as condições naturais da região e, sobretudo, com o bom acolhimento concedido pelos líderes locais à presença portuguesa e pela sua abertura à conversão ao catolicismo.

É de destacar a influência exercida por João Ramalho, um português que ali vivia há várias décadas entre os índios Tupiniquins e que tinha casado com a filha de um dos chefes. Foi, portanto, uma fundação pacífica e consensual, que resultou da vontade dos missionários de desenvolverem o seu trabalho de forma autónoma e longe da influência das autoridades e dos colonos portugueses. 

Fundação de São Paulo, Oscar Pereira da Silva, 1909
Fundação de São Paulo, Oscar Pereira da Silva, 1909

A cidade de São Paulo não teve apenas um nascimento, mas sim vários.

Vejamos o que o estudioso Eduardo Bueno (2004, p. 7) afirma sobre a fundação da cidade:

O primeiro, inteiramente informal, deu-se com o enigmático João Ramalho, entre 1510 e 1515, provavelmente no sítio, ou nos arredores, da futura Santo André da Borba do Campo; o segundo foi obra do fidalgo Martim Afonso de Sousa, no verão de 1532, em local desconhecido mas talvez no atual centro histórico, na colina de Tabatinguera; o terceiro surgiu da iniciativa do padre Leonardo Nunes, responsável pelo estabelecimento da capela de Santo André da Borba do Campo, em junho de 1550; o quarto, consagrado pela historiograia clássica, concretizou-se com a missa rezada pelos jesuítas, em 25 de janeiro de 1554, no pátio do Colégio, e por fim, o quinto, e definitivo, ocorreu em 1560, quando os moradores de Santo André se transferiram para Piratininga, onde até então não existia uma vila, e muito menos uma cidade, mas tão somente o pequeno colégio e igreja dos jesuítas.

Para nós, o marco de nascimento da cidade de São Paulo não é importante, porém devemos ter clareza que o fato da cidade ter sido fundada no século XVI significa que ela pôde se desenvolver participando de praticamente todos os acontecimentos do Brasil colonial.

É essa a importância da cidade, desse verdadeiro marco civilizatório, que hoje é uma das maiores cidades do mundo.

A fundação da cidade de São Paulo representou uma alternativa de colonização, necessariamente não baseada na monocultura da cana-de-açúcar.

Sua economia era variada, porém o que predominou foram as andanças dos bandeirantes pelos sertões e a caça ao índio.

Encravada no sertão, a mais de 750 metros do nível do mar, ergueu-se a vila de São Paulo de Piratininga, cuja privilegiada posição geográfica predestinou-a ao domínio do Planalto Meridional brasileiro, ou seja, à condução do movimento de penetração, desbravamento e conquista de grandes áreas situadas além do meridiano de Tordesilhas (HOLANDA, 2007, p. 300).

São vários os motivos que levaram a região do planalto a superar a região litorânea no processo de povoamento e colonização, nas palavras de Sergio Buarque de Holanda ( 2007, p. 301).

Eis como o planalto, na região vicentina, sobrepujou o litoral, pelas vantagens que oferecia à colonização.

A estreita faixa costeira, os terrenos baixos constituídos por mangues e pântanos, a inexistência de um solo rico e comparável aos massapés do nordeste do Brasil, um clima tropical, gerador de endemias, tudo isso contribuiu de forma a impulsionar o homem serra acima, permanecendo quase desprezada a zona costeira.

Os fatores geográficos explicam, pois, vários motivos de deslocamento do centro colonização do litoral para o planalto, da escolha do sítio para a localização da célula inicial do aglomerado paulistano e do seu posterior desenvolvimento.

A região de São Paulo obteve condição propícia para o seu desenvolvimento em virtude da sua posição geográfica que facilitava o contato com outras regiões do Brasil. A partir do planalto paulista, o viajante poderia alcançar o sul, o centro-oeste e o nordeste.

Para facilitar o entendimento desta questão introduziremos um fragmento do livro “História Geral da Civilização Brasileira” do historiador Sergio Buarque de Holanda (2007, p. 302-303).

Zona de convergência das linhas do relevo e do sistema hidrográfico da região, São Paulo de Piratininga é um centro de entroncamento de passagens naturais. Sem dúvida alguma, foi esse um fator de grande influência no estabelecimento da vila e no seu destino pioneiro.

Três grandes passagens partem de São Paulo, seguindo as linhas do relevo que condicionaram as diretrizes da expansão:

  • A passagem rumo nordeste, pelo vale do Paraíba, rota das expedições para Minas Gerais, para o rio São Francisco, para o norte e nordeste do Brasil.
  • A passagem para o norte, por Campinas e Mojimirim em direção a Minas Gerais e Goiás.
  • A passagem em direção ao sul e sudoeste, via Sorocaba e Itapetinga visando às regiões meridionais.

As duas primeiras resultam da posição da serra da Mantiqueira que penetra em São Paulo pelo norte, como uma cunha cuja ponta é o morro do Jaraguá.

De um lado e de outro  situam-se, então, a passagem da planície da Paraíba para o nordeste e a passagem em direção norte formada por terrenos da depressão periférica mais ou menos planos que se estendem do nordeste do Estado – Mococa, Casa Branca – até sudoeste – Itararé, Faxina -, descrevendo amplo arco de círculo, cuja face convexa passa nas proximidades de São Paulo, por Campinas e Itu.

São terrenos que para oeste seguem-se logo após a escarpa da Mantiqueira ao norte de São Paulo e para o sul sucedem-se à topografia movimentada da serra de Paranapiacaba.

A passagem rumo sul é a própria continuação desses terrenos de configuração quase uniforme, que continuam em direção às partes meridionais do Brasil, infletindo para sudoeste na altura de Itapetininga.

Foi a passagem que facilitou a penetração dos paulistas até o vale do Paranapanema e seus afluentes da margem esquerda, onde se estabeleceram os jesuítas em terras do alto Paraná no século XVII.

Nesses terrenos localizam-se os campos de Sorocaba e de Itapetininga, aproveitando nas comunicações estabelecidas não só com a região do Paraná, como de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, percorrida e devassada pelos bandeirantes.

Essas três grandes passagens naturais que convergem para São Paulo, estabelecidas pelo relevo, fizeram de Piratininga um verdadeiro núcleo do sistema topográico da região, possibilitando e canalizando a expansão desbravadora e colonizadora levada avante naquelas direções rumo ao interior do Brasil.

Além disso, São Paulo foi a escala intermediária das comunicações entre o planalto e o litoral.

O caminho do mar, antiga trilha dos índios, foi a principal via de passagem da Capitania de São Vicente através da serra, não obstante as grandes dificuldades que se antepunham ao livre trânsito.

Ainda mais.

A presença do rio Tietê fez de São Paulo o centro natural de importante sistema hidrográico.

Acessível pelo Tamanduateí nos tempos coloniais, cortando todo o território paulista rumo noroeste e atirando-se no rio Paraná, o rio Tietê estabeleceu comunicações fluviais para a região de Mato Grosso.

Por aí navegaram as monções cuiabanas no século XVIII.

O rio Tietê fez de São Paulo um centro privilegiado, pois o mesmo corria em direção ao interior. Esse rio era uma verdadeira hidrovia, que facilitava a penetração dos bandeirantes em direção ao sertão.

Além disso, convergiam para São Paulo diversas rotas sertanistas, são elas:

  • o caminho do vale do Paraíba, que levava às “minas gerais”;
  • o caminho do sul, que levava às missões jesuíticas;
  • os caminhos do norte que levavam até Goiás;
  • o caminho fluvial do Tietê que levava em direção a Cuiabá;
  • o caminho do mar que levava em direção norte e sul.

Em função do que foi exposto anteriormente podemos perceber que a fundação de São Paulo não foi casual.

A localização da cidade é estratégica, possibilitando ao colonizador alcançar praticamente todas as regiões do Brasil, a partir de uma sede segura.

São Paulo nunca sofreu ações e pilhagens de piratas, pois a mesma ficava no interior.

São Paulo foi o primeiro centro urbano brasileiro a se encontrar afastado do litoral.

Além disso, a tipologia social e étnica do morador da cidade era única. O paulista era fruto da mistura do branco com o índio, pois esse fator fez do bandeirante paulista uma pessoa altamente adaptada para as grandes expedições de colonização.

No próximo item iremos estudar a tipologia social do bandeirante paulista, bem como sua importância no processo de colonização e povoamento do Brasil colonial.

Diferença entre entradas e bandeiras
Diferença entre entradas e bandeiras

3. Os Bandeirantes

A pobreza da capitania de São Vicente (atual Estado de São Paulo) devido à decadência dos canaviais durante o Período Colonial estimulou a organização de expedições pelo interior do Brasil conhecidas como bandeiras e entradas.

Entradas e Bandeiras

O bandeirante paulista não era aquela figura romântica idealizada e retratada, através da pintura ou da escultura, nos séculos XIX e XX.

Na verdade, o bandeirante era uma figura “rude”, mistura de branco com índio (mameluco), que soube se adaptar muito bem à lida dos sertões.

Geralmente ele se vestia com as poucas roupas que tinha à disposição, andava descalço como o índio, sua imagem era muito diferente daquela que estamos acostumados a ver nas imagens dos livros de história.

Além disso, temos que desconstruir a ideia de que o bandeirante era um herói. Na verdade, em muitos momentos da história colonial, ele foi um vilão que escravizava e tratava com extrema crueldade os índios, destruindo aldeias inteiras.

Apesar disso, o bandeirante foi muito importante para a história colonial brasileira, pois o mesmo foi o responsável por ações que levaram o Brasil a ampliar os limites do Tratado de Tordesilhas.

Além disso, foi ele o responsável pelo achamento de metais preciosos nos sertões brasileiros. Sem falar que, a partir da sua iniciativa, diversos povoados e vilas foram fundados em várias regiões do Brasil.

Nas palavras de Eduardo Bueno (2003, p. 59):

Eles eram os piratas do sertão. Perambulavam pelos atalhos, pelos planaltos e pelas planícies armados até os dentes, com seus sons de guerra e suas bandeiras desfraldadas.

Eram grupos paramilitares rasgando a mata e caçando homens – para além da lei e das fronteiras; para aquém da ética.

À sua passagem, restava apenas um rastro de aldeias e vilas devastadas; velhos, mulheres e crianças passadas a fio de espada; altares profanados, sangue, lágrimas e chamas.

Incendiados pela ganância e em nome do avanço da civilização, escravizaram indígenas aos milhares.

Alguns historiadores paulistas os definiram como uma “raça de gigantes” – e não restam dúvidas de que eles foram sujeitos intrépidos e indomáveis.

São tidos como os principais responsáveis pela expansão territorial do Brasil – e com certeza o foram. Embora tenham sido heróis brasileiros, tornaram-se também os maiores criminosos de seu tempo.

Nas primeiras três décadas do século XVII, os bandeirantes mataram ou escravizaram cerca de 500 mil índios, sem falar que destruíram mais de cinquenta reduções jesuíticas.

Eles enfrentaram os reis de Portugal e Espanha, além do próprio Papa.

Transformaram sua capital, São Paulo “[…] num dos maiores centros do escravismo indígena de todo o continente e […] fizeram dela uma cidade sem lei, reino de terror, ganância e miséria.

E também o polo a partir do qual todo o sul do Brasil pôde crescer e se desenvolver” (BUENO, 2003, p. 58).

A história do bandeirante é uma história de contradições, pois ao mesmo tempo que são odiados e retratados enquanto criminosos, são amados e elevados como heróis.

São Paulo foi uma cidade que nasceu pobre, mas era necessário “buscar o remédio para a sua pobreza”, remédio este que seria possível apenas com a ação do bandeirante.

Foi logo, então, que o paulista descobriu a escravidão do índio como sua principal fonte de riqueza.

A ironia se constrói no sentido de que o próprio bandeirante paulista era metade índio, quem sabe a selvageria não tenha sido uma forma de negar a descendência?

A mistura de raças foi determinante na índole do bandeirante, segundo Sergio Buarque de Holanda (2007, p. 307):

O mameluco, além do espírito aventureiro, da intrepidez, audácia e mobilidade do pai, receberam por via materna o amor à liberdade, a índole inquieta e nômade e as inclinações sertanistas do ameríndio também dotado de extrema mobilidade.

Constituíram os elementos formadores da maior parte das primeiras famílias paulistas, troncos originários de gente possuidora de estupendos atributos de fecundidade, longevidade e virilidade, gente que mais tarde Saint-Hilaire denominou “raça de gigantes”.

Foram essas famílias patriarcas, amestiçadas e cristãs, as vigas mestras do grupo social que gerou os contingentes humanos das bandeiras. Para elas, participar de uma daquelas expedições era índice de prestígio e título de honra.

A escravidão dos índios reduzidos nas missões jesuíticas era ilegal, porém os paulistas não respeitavam essa regra. Eles viviam no topo do planalto, isolados de todo o resto do Brasil.

Além disso, se sentiam abandonados pela coroa e não respeitavam as regras e acabavam atacando até mesmo a mais organizada redução jesuítica.

Foram os paulistas que destruíram os chamados “sete povos das missões”, no Rio Grande do Sul.

Reduções jesuíticas famosas pelas belas construções e a difusão da cultura entre os índios, incentivada pela dedicação e ensino dos padres jesuítas.

Porém, também foram os bandeirantes os primeiros a achar pedras preciosas no interior do Brasil.

A coroa portuguesa passou a enviar cartas régias incentivando os bandeirantes a organizarem expedições com o intuito de encontrarem ouro.

As primeiras expedições foram organizadas ainda no século XVI, porém o sucesso só viria a acontecer na inal do século XVII.

Certamente as cartas enviadas pelo rei a, pelo menos, onze renomados bandeirantes tenham surtido efeito, pois diversas expedições foram realizadas.

Segundo Eduardo Bueno (2003, p. 103):

Alguns historiadores acham que “os efeitos psicológicos” que as missivas (cartas) reais de Pedro II teriam exercido sobre os onze sertanistas que as receberam não devem ser desconsiderados.

Mas o fato é que aos bandeirantes de São Paulo não restava outra forma de manter suas vidas nômades senão caçando ouro: seus “currais” indígenas estavam esgotados.

Ao rei também não sobrava outra opção: anos antes, enquanto perdurava a União Ibérica, foram enviados da Corte especialistas em minas para estudar as potencialidades minerais do Brasil.

O único deles que resistiu às agruras do sertão – o espanhol Rodrigo Castelo Branco – foi assassinado por Borba Gato, genro de Fernão Dias, assim que chegou à mina que o “caçador de esmeraldas” acabara de descobrir.

Depois deste crime sem castigo, quem não fosse bandeirante e paulista não se arriscaria a percorrer os ermos do Brasil.

Aos paulistas caberia a façanha de encontrar a maior jazida de ouro já encontrada no mundo. Mas não seriam eles que lucrariam com ela.

Desta forma, por volta de 1694, os bandeirantes paulistas escreveram a sua história ao acharem ouro nos sertões do Brasil. A partir desta data a história de Portugal e do Brasil iria mudar, pois as reservas descobertas eram as maiores do mundo.

4. Leitura Complementar – O Navio Negreiro

Terá sido o pior lugar do mundo, o ventre da besta e o bojo da fera, embora para aqueles que eram responsáveis por ele, e não estavam lá, fosse o mais lucrativo dos depósitos e o mais vendável dos estoques.

O Navio Negreiro

No porão dos navios negreiros que por mais de trezentos anos cruzaram o Atlântico, desde a costa oeste da África até a costa nordeste do Brasil, mais de três milhões de africanos fizeram uma viagem sem volta, cujos horrores geraram fortunas fabulosas, ergueram impérios familiares e construíram uma nação.

O bojo dos navios da danação e da morte era o ventre da besta mercantilista: uma máquina de moer carne humana, funcionando incessantemente para alimentar as plantações e os engenhos, as minas e as mesas, as cãs e a cama dos senhores – e, mais do que tudo, os cofres dos traficantes de homens.

A cena foi minuciosamente descrita por centenas de observadores.

Quanto mais são os depoimentos cotejados, mais difícil é crer que tamanhos horrores possam ter se prolongado por três séculos – e que tantos sobrenomes famosos tenham seu fausto e suas glórias vinculados a tanta desgraça.

Mas assim foi, e assim teria sido mais tempo se, por circunstâncias meramente econômicas, a escravidão não deixasse de ser um negócio tão lucrativo.

Castro Alves compôs versos repletos de furor e fúria.

Rugendas usou tons sombrios e um ângulo surpreendente para criar um relato alegórico.

Ainda assim, ambos, poeta e ilustrador, talvez tenham transmitido uma versão branda do espetáculo hediondo que de fato se desenrolava no porão dos navios negreiros – apropriadamente chamados de tumbeiros.

Os registros escritos por observadores – a maioria deles britânicos – revelam um quadro ainda mais assustador do que aquele que as rimas e as tintas puderam pintar.

Um único exemplo.

Em 1841, a belo-nave inglesa Fawn capturou, na costa brasileira, o navio Dois de Fevereiro.

Desde 7 de novembro de 1831, o tráfico era ilegal no Brasil e navios de guerra britânicos patrulhavam o litoral.

Após a apreensão do tumbeiro, o capitão do Fawn anotou, no diário de bordo, a cena com a qual se deparou nos porões da embarcação: “os vivos, os moribundos e os mortos amontoados numa única massa.

Alguns desafortunados no mais lamentável estado de varíola, doentes com oftalmia, alguns completamente cegos; outros esqueletos vivos, arrastando-se com diiculdade, incapazes de suportar o peso de seus corpos miseráveis.

Mães com crianças pequenas penduradas em seus peitos, incapazes de darem a elas uma gota de alimento.

Como os tinham trazido até aquele ponto era surpreendente: todos estavam completamente nus.

Seus membros tinham escoriações por terem estado deitados sobre o assoalho durante tanto tempo.

No compartimento inferior o mau cheiro era insuportável. Parecia inacreditável que seres sobrevivessem naquela atmosfera”.

Na verdade, um em cada cinco escravos embarcados na África não sobrevivia à viagem ao Brasil – constituíam mercadoria literalmente perecível.

Os demais não viviam mais do que sete anos, em média.

Mas eram baratos e substituíveis: havia muitos outros no lugar de onde tinham vindo aqueles.

Esta é uma nação erguida por seis milhões de braços escravos – e sobre três milhões de cadáveres.

FONTE: Bueno (2003, p. 112)

Neste capítulo você estudou que:

  • A fundação da cidade de São Paulo foi determinante para o processo de ocupação do interior do Brasil.
  • Os bandeirantes foram os principais responsáveis pela ampliação dos limites do Tratado de Tordesilhas.
  • Os bandeirantes foram responsáveis pela caça ao índio e pelo achamento de ouro no interior do Brasil.

Veja os seguintes Períodos da História do Brasil Colonial:

  1. Independência do Brasil – Rompimento dos laços coloniais no Brasil
  2. Império Português no Brasil – Família Real Portuguesa no Brasil
  3. Transferência da corte portuguesa para o Brasil
  4. Fundação da cidade de São Paulo e os Bandeirantes
  5. Periodo de Transição entre o Brasil Colônia e Brasil Império
  6. Engenho Colonial Açucareiro no Brasil
  7. Monocultura, Trabalho Escravo e Latifúndio no Brasil Colônia
  8. Instalação do Governo Geral no Brasil e a Fundação de Salvador
  9. A Expansão Marítima Portuguesa e a Conquista do Brasil
  10. Ocupação da Costa Africana, das Ilhas do atlântico e a viagem de Vasco da Gama
  11. Expedição de Pedro Álvares Cabral e a Conquista do Brasil
  12. Período Pré-Colonial no Brasil – Os Anos Esquecidos
  13. Instalação da Colônia Portuguesa no Brasil
  14. Períodos da História do Brasil Colonial
  15. Períodos Históricos do Brasil

 

Hide picture